NOTA SOBRE A CIRCULAR Nº 622/2020
Hoje foi publicada a Circular SUSEP nº 622/2021 que altera a Circular SUSEP nº 612, de 18 de agosto de 2020, que dispõe “sobre a política, os procedimentos e os controles internos destinados especificamente à prevenção e combate aos crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, ou aos crimes que com eles possam relacionar-se, bem como à prevenção e coibição do financiamento do terrorismo”. A alteração refere-se à prorrogação do prazo para início de vigência da Circular, que passou de 01/03/2021 para 01/05/2021, com exceção dos artigos 45 e 46 que entraram em vigor desde a publicação da Circular nº 612/2020 (02/09/2020).
O QUE ISSO SIGNIFICA NA PRÁTICA? Com base na Lei nº 9613/1998, que dispõe sobre os crimes de lavagem de dinheiro, o corretor de seguros é um dos profissionais obrigados a efetuar a identificação dos clientes e a manutenção de registros, de modo a contribuir para a investigação e prevenção de ilícitos. Assim, a lei dispõe que os corretores de seguros, e outros profissionais (art. 10, incisos II e III da Lei nº 9613/1998) possuem as obrigações de identificar seus clientes e manter cadastros atualizados nos termos de instruções emanadas pelas autoridades competentes e de adotar políticas, procedimentos e controles internos, compatíveis com seu porte e volume de operações, na forma disciplinada pelos órgãos competentes. A SUSEP, no bojo de suas atribuições, com base na referida Lei, editou a Circular nº 612 com o objetivo de regulamentar as regras específicas para cumprimento da legislação, abrangendo todos os profissionais da categoria. Logo, na prática, a edição da Circular publicada hoje prorroga o prazo de vigência das regras contidas na Circular nº 612 para 01/05/2021, sendo que certo que, no caso de descumprimento de suas disposições, os corretores de seguros estarão sujeitos às penalidades descritas na Resolução CNSP nº 393, de 30 de outubro de 2020, que possui seção específica (Seção IX) para as sanções relacionadas às infrações aos mecanismos de controle de prevenção à lavagem de dinheiro, com penalidades diversas, inclusive multas que podem chegar a R$ 700.000,00.
MAS E AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS? O artigo 47 da Circular SUSEP nº 612/2020 dispõe que “os corretores de seguros, quando seu faturamento bruto anual for inferior a R$ 12.000.000,00 (doze milhões de reais) no exercício precedente, e os resseguradores admitidos, devem criar controles compatíveis com os riscos de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo incorridos em suas operações.” Isso significa que mesmo os corretores de seguros com faturamento menor do que doze milhões ao ano, inclusive as micro e pequenas empresas, devem dispor de mecanismos minimamente compatíveis com os riscos de suas atividades, dentre os quais estão elencadas, entre outras obrigações, as políticas para comunicação de suspeitas de irregularidades aos órgãos competentes e obrigatoriamente:
I. política de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo com as diretrizes para implementação de procedimentos:
a) de coleta, verificação, validação e atualização de informações, e condução das devidas diligências, visando a conhecer os clientes, os funcionários, os parceiros e os prestadores de serviços terceirizados;
b) de registro de operações e de serviços;
c) de monitoramento, seleção e análise de operações e situações suspeitas, incluindo os prazos máximos de seleção da operação ou do conjunto de operações e de conclusão da análise;
d) de comunicação de operações ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf); e
e) de análise de indisponibilidade de ativos de quaisquer valores, de titularidade, direta ou indireta, de pessoas naturais, de pessoas jurídicas ou de entidades, nos termos da Lei nº 13.810, de 08 de março de 2019. II. efetuar a identificação de seus clientes, beneficiários, terceiros e beneficiários finais, mantendo tais informações atualizadas e coletando, minimamente:
I – quando pessoa natural:
a) nome completo;
b) número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF); e
c) endereço residencial. II – quando pessoa jurídica: a) a denominação ou razão social;
b) o número de identificação no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), ou registro equivalente para as empresas isentas do CNPJ;
c) endereço da sede;
d) as informações do inciso I para controladores até o nível de pessoa natural, principais administradores e procuradores; e
e) as informações do inciso I para beneficiários finais.
A Circular nº 612/2020 revogou sua antecessora, de nº 455/2012, que não obrigava os corretores de seguros com faturamento anual inferior a 12 milhões de reais a possuírem procedimentos de controles internos, passando a determinar que os profissionais do setor implementem políticas de controles compatíveis com os riscos de suas atividades. Logo, os corretores de seguros de todos os portes deverão possuir políticas de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, com disposições mínimas relacionadas à identificação de seus clientes, com reflexos diretos na também recente obrigação de observação às disposições da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Sancionada em 2018, a LGPD passou a vigorar em setembro de 2020 e exige que os controladores de dados pessoais, ou seja, aquelas pessoas físicas ou jurídicas que tratem dados pessoais, disponham de mecanismos de segurança contra vazamento de dados, bem como políticas claras sobre uso e compartilhamento destas informações. Contudo, muito embora a LGPD disponha sobre princípios básicos aplicáveis na seara da proteção à intimidade e à privacidade, há reserva legal de que a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão regulador e fiscalizador do assunto, venha a dispor sobre regras e procedimentos específicos para microempresas e empresas de pequeno porte, “bem como iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclarem startups ou empresas de inovação”, para que possam se adequar às disposições da Lei (art. 55-J, inciso XVIII da LGPD). Ou seja, não obstante as regras dispostas na Lei, a aplicação de suas disposições e os prazos de implementação para micro e pequenas empresas serão dispostos de forma diferenciada, sobretudo levando em consideração que esta fatia empresarial consiste em aproximadamente 90% das empresas do Brasil e que, certamente, também abrange a maior parte das empresas corretoras de seguros do país.
MAS E AGORA? A partir do exposto, em que pese a obrigação sobre a existência de controles para prevenção de ilícitos decorra de Lei, o próprio texto legal atribui a prerrogativa do órgão competente dispor sobre as regras específicas para aplicação da Lei sobre o respetivo segmento. Neste sentido, a Constituição Federal Brasileira determina que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei” (art. 179, CF/88), o que denotaria a necessidade de que, também na edição dos atos infralegais da SUSEP, o órgão fiscalizador dispusesse sobre regras que estivessem alinhadas ao tratamento diferenciado para simplificação de obrigações administrativas, a exemplo da Circular antecessora. Muito embora seja possível identificar que o texto da Circular SUSEP nº 612/2020 permite a avaliação do nível de exposição de riscos do profissional para implementação de controles, há clara determinação para que sejam cumpridas regras que não eram exigíveis em edições normativas anteriores e que demandam esforços e investimentos por parte da categoria. Diante do exposto, reputa-se de grande importância o diálogo institucional dos entes representativos da categoria com o órgão fiscalizador para, em sendo possível, a prorrogação das determinações aos corretores de seguros pessoas físicas e empresas de micro e pequeno porte, além de disposições simplificadas para que este nicho empresarial possa contribuir para o combate aos ilícitos dentro de parâmetros mais claros e simplificados, sem sacrifício de seu desenvolvimento econômico.